sexta-feira, 11 de outubro de 1991



SINOPSE:
Em uma cidade costeira da Califórnia atua uma gangue de ladrões de banco que se autodenomina "Os Ex-Presidentes", pois cometem seus assaltos usando as máscaras de Reagan, Carter, Nixon e Johnson.
O F.B.I. acredita que os membros da quadrilha possam ser surfistas e manda para lá um jovem agente disfarçado, Johnny Utah (Keanu Reeves), que tem como missão se infiltrar entre os surfistas e obter informações.
Para isto ele precisa aprender a surfar, algo que seu chefe não gosta muito. Com o auxílio de Angelo Pappas (Gary Busey), outro agente, Johnny chega a uma comunidade de surfistas onde os dois se infiltram, desconfiados que o autor dos assaltos está ali. Lá ele conhece Bodhi (Patrick Swayze), um homem místico e muito inteligente, que começa a mostrar a Johnny uma maneira diferente de ver o mundo.

INFORMAÇÕES:
Categoria: Ação
Direção: Kathryn Bigelow
Elenco: Patrick Swayze, Keanu Reeves, Gary Busey
Título original: Point Break
Duração: 2h 02min
Ano: 11 de Outubro de 1991

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Enredo (Contém Spoiler)

A trama começa com a entrada de Johnny Utah (Keanu Reeves) para o FBI. Lá, seu trabalho é identificar e prender um grupo de assaltantes a banco conhecidos como "ex-presidentes", devido às máscaras que os caracterizam. Seu parceiro no FBI, o já veterano Angelo Pappas (Gary Busey), lhe dá a dica (e o pressentimento) de que se trata de um grupo de surfistas que assaltam bancos para poderem curtir as maiores ondas do mundo, encontradas sempre no verão.

O filme não faz concessões verossímeis nesta inserção de um policial certinho num mundo louco de surfistas. Sua chegada lá é quase injustificada, sendo a linha narrativa bastante frágil. E se o filme não se importa com isso, não serão os personagens, tampouco os espectadores que se importarão. Em determinado momento o chefe de polícia – a figura sã e consciente, detentora da sabedoria mantenedora da ordem – repreende os dois agentes por se infiltrarem neste mundo de curtição. Utah aparece no escritório do FBI carregando uma prancha de surfe debaixo do braço. “Ela não deixava a porta do carro fechar”. E então o próprio chefe de polícia se questiona sobre a loucura com a qual estava sendo conivente. Como deixar que o FBI financie a missão de dois agentes que só fazem surfar e curtir o verão? A analogia com o filme é evidente. Como corroborar com a idéia de que dois policiais, numa investigação pouco desenvolvida (em época que o cinema americano já lidava com computadores, alta tecnologia, modernas ferramentas de busca, um arsenal de elaborações investigativas) acabem sempre em praias paradisíacas, parecendo somente buscar belas imagens? Espectadores, também controladores do filme, se deixam levar, no entanto, pela aventura que se coloca, abrindo mão da identificação com o policial-regulador.

E então se abre espaço para a penetração nesse mundo das ondas gigantescas, da vida aventureira e perigosa, proporcionadora da adrenalina necessária para a sobrevivência. Caçadores de Emoção tem um quê da filosofia do carpe diem. Mas, antes de se prender a questões morais, à preocupação com o tempo que fica para trás, o filme dá toda atenção ao presente, à vida que pulula chamando a aventura para si. Johnny Utah não se questiona moralmente sobre o fato de se deixar levar por este universo novo que a ele se impõe. Conhece uma garota, aprende a surfar e aproveita as altas ondas; curte as festas e o bem-estar de um grupo liberto das tradições cotidianas, ligadas ao trabalho e à diversão como libertação da exaustão. Deixa-se envolver com Bodhi (Patrick Swayze), personagem-ícone da aventura e desprendimento das convenções sociais. A complacência de Utah com Bodhi é a evidência da assimilação de uma filosofia de vida diferente e – por que não? – uma certa inveja positiva de um modo de vida liberto e intenso.

Caçadores de Emoção repensa o local de estabilidade do indivíduo. O começo da década de 90 ao mesmo tempo em que dava os primeiros indícios da contaminação demasiada dos elementos de aceleração do tempo, também se abria para a sedimentação do indivíduo sobrevivente do néon dos anos 80, e que agora deveria reencontrar seu espaço. As ondas gigantes, por vezes dominadas pelos surfistas (nesta já antiga batalha do homem com a natureza), estão mais ligadas à satisfação de necessidades individuais. Mais do que o imperativo da dominação do obscuro e do desconhecido, os personagens de Caçadores de Emoção querem vivenciar estas experiências e aproveitar a descoberta de novas sensações. Chegar ao topo da onda, viver o ineditismo de estar no meio dela, (“peguei o meu primeiro tubo”, diz Utah), aproveitar a liberdade momentânea que o vôo livre propicia. A ressaca do “mais” da década de 80 faz com que os personagens redescubram na natureza as potencialidades da aventura e das novas sensações.

No entanto, para que se possa vivenciar essas sensações é preciso estar conectado, de alguma maneira, ao universo urbano e comercial. Adaptado, inserido ou transgredindo a primeira levada que o mundo dos anos 90 apontava, os personagens, para sobreviverem e manterem seus prazeres, carecem da fonte mantenedora da diversão: o dinheiro.

É aí que o filme dialoga diretamente com questões palpáveis ao espectador. A premissa da existência de surfistas-ladrões de banco é uma contradição em si mesma (parte ligada à natureza, outra ligada às questões políticas envolvidas). Em Caçadores de Emoção os assaltos a bancos são metáforas do mecanismo político vigente naquele momento (e que perdura até hoje). Os assaltantes vestem máscaras com os rostos dos ex-presidentes americanos não apenas como um disfarce qualquer, mas numa clara analogia a (supostos) roubos cometidos por eles. Ainda que cite os nomes dos presidentes - Carter, Nixon, Reagan, Johnson - o filme critica a própria figura política, sempre passível e complacente com a corrupção. Mas a metáfora do assalto não termina aí. Os ex-presidentes americanos, se roubavam, não o faziam por necessidade, mas sim por esta ser uma oportunidade fácil de enriquecimento. Um dinheiro comumente aplicado em investimentos, ou em mansões, casas, aviões e festas. Da mesma forma que os ex-presidentes, os surfistas estão, de certo modo, apenas "remanejando" algum dinheiro capaz de suprir suas necessidades para a diversão.

Então entra em cheque uma problemática que perpassa a vida do homem. A circularidade contínua presente nos pilares Trabalho, Dinheiro e Tempo inviabiliza seu funcionamento saudável. Numa lógica simples, sabe-se que um ao tornar o outro realizável, acaba por impedir o terceiro. Essa indagação contemporânea - ainda não resolvida - está apontada no filme, já no começo da década de 90. Ainda que a problemática não seja atual, em Caçadores de Emoção ela está presente na contextualização das ações e práticas características de um momento. O filme repensa e atualiza essa questão, colocando em cheque uma tradição que parecia se reassentar naquele momento: a de que o trabalho enobrece. O filme repensa a diversão e o aproveitamento da vida não como instâncias de fuga ou momentos de escape, mas como vivência primeira. E se tal questão prediz a moral, o filme a deixa de lado, não se posicionando entre policiais e bandidos. Os transgressores da tradição e dos bons costumes (ladrões de banco) são também mantenedores da filosofia que, no fundo, os aceitos da sociedade gostariam de compartilhar. O filme toca na ferida, ao despertar o imaginário da vontade do indivíduo perante o coletivo: roubar a si mesmo (uma vez sendo conivente com o sistema preponderante) para poder fazer o que se tem vontade.

Caçadores de Emoção ativa as vontades do indivíduo, mesmo que elas problematizem seu padrão. E para isso, a diretora Kathryn Bigelow se utiliza das imagens mais fortalecedoras dessa altivez: a praia, o pôr-do-sol, o paradisíaco, o mar, o vento. Todos elementos povoadores do lugar imaginado como o paraíso. O filme é diversão em sua premissa, notada na conversão em imagens com muita adrenalina e disposição. Das mil facetas de Caçadores de Emoção, todas elas levam a um ponto convergente: o local do prazer. Um filme hedonista, portanto, que passa por cima dos traumas de infância (a morte dos pais de Tyler), das frustrações da juventude (o joelho irrecuperável de Utah que o fez abandonar o futebol americano), da violência, da caretice e da tradição, contornando-as e apresentando um espaço imaginado e, sobretudo, existente.


outubro 11, 1991   Posted by Admin in with No comments

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